Jus postulandi na Justiça do Trabalho
Aristides Medeiros
ADVOGADO
Há algum tempo, antes do início de vigência do atual CPC (L. 5869 = 110173), escrevi o seguinte:
“Dispõe o art. 106, caput,
do Código de Processo Civil (DL 1608 = 180939), que o ingresso das partes em
juízo requer, além da capacidade legal, a outorga de mandato escrito a advogado
legalmente habilitado”.
Tal norma assegura a necessária existência do
jus postulandi, ou capacidade postulatória (cf. JOSÉ FREDERICO MARQUES, in
Instituições de Direito Processual Civil, 1958, Vol. II, § 71, A, pág. 183 e segs).
Dir-se-á, todavia, que a
Consolidação das Leis do Trabalho, - por ser diploma posterior ao CPC/39, e por
tratar de matéria especial, - terá consignado uma exceção a esse princípio, ao
admitir a legalidade de Reclamação Trabalhista ajuizada diretamente pelos
empregados e empregadores (art. 791,caput; art. 839, alínea a), o mesmo
acontecendo com relação ao disposto no art. 3º da Lei nº 1.890, de 13/06/53.
Ocorre, entretanto, que,
com a edição da Lei nº 4.215, de 27/04/63 – que “Dispõe sobre o Estatuto da
Ordem dos Advogados do Brasil”, - houve substancial alteração quanto à aludida
exceção, isso pela incidência do contido em o § 1º do art. 2º da impropriamente
chamada Lei de Introdução ao Código Civil.
Com efeito, estatui o § 3º
do art. 71 do Estatuto que compete privativamente a advogado, entre outras
coisas, elaborar e subscrever petições iniciais, esclarecendo o art. 76 que são
nulos os atos privativos de advogados praticados por pessoas não inscritas na
Ordem.
Ora, o Termo de
Reclamação Trabalhista representa uma petição inicial apresentada oralmente e
reduzida a escrito, e, como tal, só pode ser assinado por advogado munido dos
competentes poderes, não podendo sê-lo diretamente pela parte que não tiver
habilitação legal. Apenas nos casos exaustivamente enumerados no art.75 poderá
a parte defender seus direitos, por si mesma ou por procurador apto, e ainda
assim mediante licença do juiz competente.
Veja-se que a lei nova nem
utilizou a clássica frase “salvo disposição em contrário”, que, aí sim,
serviria para dar validade à apontada norma da CLT. Na verdade,
não foi consignada nenhuma exceção ao exercício do jus postulandi por
pessoa outra que não algum inscrito nos Quadros da Ordem, pelo que
inexoravelmente se consideram derrogados, para esse efeito, as já mencionadas disposições
da CLT e a da Lei nº 1.890/53.
Por outro lado, não se diga
que a fiel observância de tal princípio legal possa vir a dificultar ou até
impossibilitar a defesa dos direitos da grande maioria dos empregados, sem
condições financeiras para contratar advogado sob pena de prejuízo do sustento
próprio ou da família. A solução para esse problema é expressamente prevista
pelo art. 68 e segs do CPC, pela Lei nº 1.060 (de 05/02/50) e pelo art. 90 e
segs da citada Lei nº 4.215, que asseguram a concessão de assistência
judiciária gratuita aos necessitados, desde que atendidos os seus pressupostos.
Tudo isso, aliás, sem se dizer que o empregado não levará qualquer desvantagem
na causa, ao ser a outra parte defendida por advogado, desvantagem essa que
haverá de ocorrer, isso sim, se lhe for permitido atuar pessoalmente, ao, como
leigo, ignorar o Direito, sendo defeso ao juiz suprir-lhe a desvantagem”.
+ + + + + + + + +
E, tempos depois, dissertei, verbis:
“........... Aliás, ad argumentandum, se mesmo assim dúvida alguma ainda pudesse existir quanto à não vigência do contido no art. 791, caput, da CLT, esta terá sido inexoravelmente espancada ex vi do preceituado no art. 133 da vigente Carta Magna, evidenciado quantum satis que a excogitada disposição da CLT não haverá de ter sido “recepcionada” pela ordem constitucional.
A propósito, tem-se que o
Pretório Excelso assim destacou:“... o direito de petição, previsto na CF 5º
XXXIV, a, não representa a garantia do próprio interessado postular em juízo,
em nome próprio. Para isso, há de estar devidamente habilitado, na forma da
lei. Não é possível, com fundamento nesse direito, garantir à parte vir a juízo
sem a presença de advogado. São distintos o direito de petição e o de postular
em juízo” (Ac. de 171293, da 1ª Turma do STF, na Pet. nº 825-1-BA, Rel.
Min. Ilmar Galvão, in DJU de 030294, pág. 787).
É bem verdade que na Lei nº 9.099, de 26/09/95 (“Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências”) veio a ser incluído dispositivo permissivo de exercício do jus postulandi por pessoa que não advogado, isso em chamadas causas “de alçada” (art. 9º). Todavia, referida disposição igualmente sofre da eiva de inconstitucionalidade, vindo bem a pelo a seguinte observação de MARCUS CLÁUDIO ACQUAVIVA,verbis: “Em que pese a louvável intenção do legislador na formulação deste dispositivo, ou seja, reduzir o formalismo processual, a norma padece de inconstitucionalidade evidente, ao conflitar com o art. 133 da Constituição Federal, sobre a imprescindibilidade do advogado na administração da justiça, assim: “Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Poder-se-ia objetar com o argumento de que a imprescindibilidade do advogado estaria restringida pela própria expressão “... nos limites da lei”, contida no transcrito art. 133, da Constituição. Não colhe, porém, tal entendimento, em face do disposto no art. 2º, caput, e § 3º, do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906, do qual se depreende que a expressão “nos limites da lei” se refere à inviolabilidade dos atos e manifestações do profissional, e não à sua presença na administração da justiça... § 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites da lei” (in Nova Leis dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Ed. Jurídica Brasileira, 1ª ed., Jan/96, pág. 24/25).
Neste passo, permita-se-me
fazer um reparo a equivocado entendimento, mais precisamente à generalizada
afirmação de que o jus postulandi “é a reclamação sem advogado, proposta
diretamente pelo trabalhador (sic) (AMAURI MASCARO NASCIMENTO, in
Iniciação ao Direito do Trabalho, LTr, 26ª ed., 2.000, pág. 577)
Não, não e não ! O jus
postulandi não é apenas isso ! Ao contrário do que dizem alguns, ele
não é tão só e circunscritamente a denominação dada ao exercício da direta
atuação da parte (quando leiga) em procedimento perante a Justiça do Trabalho,
o que amiúde se tem erroneamente perorado à alegação de aplicação do expressado
no art. 791, caput, da CLT, mas, sim, é a chamada capacidade
postulatória, legalmente atribuída a alguém (in casu, somente a advogado
– CPC, art. 36), cuja inobservância haverá de acarretar a extinção do processo
(cf. art. 267, caput, inc. IV, c/c art. 13, tudo do CPC). Vide inclusive o que
escrevi no início do artigo “Entes públicos: presentação e representação em
juízo”.
No dizer do autorizado JOSÉ FREDERICO MARQUES, a capacidade postulatória tem a ver com o “patrocínio ou assistência de profissional do direito – o advogado, - que tem o jus postulandi, ou poder de agir e falar em nome das partes em juízo” (in Manual de Direito Processual Civil, Saraiva, 5ª ed., 1977, Vol.I,nº225,pág.251).
No dizer do autorizado JOSÉ FREDERICO MARQUES, a capacidade postulatória tem a ver com o “patrocínio ou assistência de profissional do direito – o advogado, - que tem o jus postulandi, ou poder de agir e falar em nome das partes em juízo” (in Manual de Direito Processual Civil, Saraiva, 5ª ed., 1977, Vol.I,nº225,pág.251).
E o TRT/12 já destacou ipsis litteris:
“Jus Postulandi. A instituição do contraditório em todo
processo judicial (CF, art. 5º, LV), em confronto com sua existência anterior
exclusivamente na instrução criminal (CF de 1969, arts. 15 e 16), resulta na
obrigatoriedade da participação do advogado em qualquer processo judicial, de
sorte que não haverá contraditório e ampla defesa sem um profissional técnico
para exerce-los. A defesa judicial – ataque e contra-ataque – somente pode ser
exercida validamente por profissional habilitado e com conhecimento
ténico-jurídico. A repristinar esta interpretação constitucional declarou o
legislador da Lei nº 8.906/94 ser privativo de advogado o jus postulandi,
donde decorre logicamente a adoção do princípio da sucumbência em qualquer
processo judicial, ab-rogando regras específicas da Lei nº 5.584/70” (Ac.
nº 716/95, da 1ª Turma do TRT da 12ª Região, Rel. Juiz Dr. F. Chedid, in DJ de
170395, pág. 55, e in Consulex, Repertório de Jurisprudência, 1996, pág. 315).
Diante de tudo isso, tenho
que, igualmente no âmbito da Justiça do Trabalho e em todas as suas instâncias,
as partes devem ser representadas por advogado legalmente habilitado, inclusive
o Reclamante sem posses, parecendo de toda procedente a afirmação de EDUARDO
GABRIEL SAAD, de que “Não é boa coisa obrigar o magistrado a ser, também,
patrono do interessado desprovido de recursos, como acontece, de há muito, na
Justiça do Trabalho” (in CLT Comentada, LTr, 32ª ed., 2000,pág.523)
Nenhum comentário:
Postar um comentário